sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Legend of Galactic Heroes - ResenhAnimes






Episódios: 110
Ano: 1988-1997
Estúdio: Artland
Gêneros: Drama, Militar, Ficção Científica, Espaço


Sinopse: Por 150 anos, a galáxia ficou presa em uma guerra interestelar entre o Império Galáctico e a Aliança dos Planetas Livres, travando batalhas com milhares de naves espaciais envolvendo milhões de soldados de ambos os lados. A decadente dinastia Goldenbaum governa o Império, enquanto que a Aliança vive uma democracia cada vez mais disfuncional.
Dois novos comandantes entram em cena: o almirante imperial Reinhard von Lohengramm e o soldado da Aliança Yang Wen-Li. Reinhard é um pequeno aristocrata talentoso que obteve alta posição -  e grande rancor – após o Kaiser levar sua irmã mais velha como concubina. Wen-Li entrou originalmente para o exército só para financiar sua educação universitária, mas torna-se um brilhante líder, embora relutante. Cada um deles começa a atrair um círculo de soldados, generais e pensadores, e com o tempo a rivalidade entre estes dois homens muito diferentes constrói o impasse existente. Enquanto eles lidam com superiores e subordinados, com problemas pessoais e políticos, estratégias de guerra e batalhas, ambos mudarão o curso dos acontecimentos às suas vontades e, por sua vez, serão desafiados pela maior guerra da história humana.




O primeiro anime que eu vi que tratava o espaço como um palco de guerras políticas foi Gundam Seed. Na época, o anime não deixou em mim uma marca forte, exceto por algumas questões que sua sequência, Gundam Seed Destiny, tratou na figura do personagem Durandal, com sua multifacetada personalidade transparecida em seus atos ambíguos. Pesquisando no AnimeList por séries que não continham determinados gêneros que desgosto profundamente (como, por exemplo, ecchis), me deparei com Legend of Galactic Heroes (“Ginga Eiyuu Densetsu”, em rõmaji). Vi um episódio e desanimei pelo seu ritmo lento. Meses depois, resolvi dar mais uma chance e hoje percebo que foi uma decisão acertada.

Legend of Galactic Heroes, é a maior série animada lançada originalmente em OVA, compreendendo 4 temporadas ao longo de quase 10 anos de existência. Complementam-na três filmes como prequelas, além de duas séries spin-offs. Estes spin-offs (intitulados “Gaiden: A Hundred Billion Stars, A Hundred Billion Lights” e “Gaiden: Spiral Labyrinth”) não tive oportunidade de assistir, mas os filmes (“Overture to a New War”, “My Conquest Is the Sea of Stars” e “Golden Wings”) são do mesmo nível da série principal. 

Este é um dos poucos animes em que seu tamanho é totalmente justificado, por ser uma ferramenta de desenvolvimento necessária da trama, dada toda a complexidade de sua proposta. Não li a novel no qual foi baseada, mas alguns fóruns afirmam que a série segue fielmente a mídia escrita. LoGH possui um roteiro maravilhosamente construído, com um ritmo lentamente desenvolvido que abre espaço para contextualização política, social e comportamental de seus personagens. 

Creio que o objetivo principal de LoGH é discutir as vantagens e fraquezas de sistemas de governo diferentes. De um lado, há o pomposo Império Galáctico, autoritário, aristocrático, feudal, tradicional e totalitário de 500 anos de existência, governado pelo Kaiser da dinastia Goldenbaum, que utiliza repressão e terror para estabelecer seu poder. Do outro lado está a Aliança dos Planetas Livres, fundada por um servo destituído do império que organiza um motim e cria um estado democrático constitucional. 

Inteligentemente, o anime não endeusa a democracia e demoniza a autocracia: pelo contrário, mostra que um ditador pode se tornar mais justo e funcional para os interesses populares e contra a própria aristocracia. E também mostra que a democracia não é um sistema perfeito: a população pode colocar governantes autoritários no poder e criar toda uma classe de políticos aliados a interesses escusos. Uma boa autocracia é geralmente melhor que uma boa democracia; uma má autocracia consegue ser pior do que uma má democracia. Uma grande sacada temática.

As subtramas compreendem as relações pessoais dos dois núcleos, de Wen-li e Lohengramm. Vários episódios são usados para desenvolver problemas familiares e amorosos, muitos deles em retrospectiva. Além desses assuntos, LoGH trabalha a influência da religião na política e como ela se imiscui em diversas áreas da sociedade visando o controle social pelo poder da fé. Algo curioso em LoGH é que a humanidade já colonizou outros sistemas solares, e a religião é justamente o “Culto da Terra”, como retorno às origens, configurando o clássico antagonismo ciência x religião. Também está presente a importância dos meios de comunicação como propagador de ideologias de governo.

Os personagens aqui são muitos. Tive dificuldade de memorizar vários deles, mesmo sendo importantes em alguns momentos. É interessante que a série os colocam não como meros figurantes, mas como agentes importantes para determinado arco, desempenhando uma função específica. Talvez por esse motivo não há grandes mudanças de personalidade: os personagens já estão desenvolvidos para um papel na história. As relações que estabelecem estão longe de serem classificadas como clichê. Muitas vezes imaginei que um fato terminaria de um jeito, enganando-me logo depois. 

O brilhantismo de seus dois protagonistas é a mola propulsora em LoGH. Lohengramm deseja se tornar o Kaiser para reformar a autocracia contra as iniquidades causadas pela aristocracia. Wen-li é atirado para a guerra sem realmente desejá-la, mas acaba se tornando o “milagre da democracia” com sua filosofia concisa e fiel através de seus atos. As estratégias de guerra desenvolvidas por eles visam anular uma à outra, terminando quase sempre em empate técnico ou em derrota, quando seus subordinados não as cumprem da forma como foram planejadas. Não há vilões em LoGH: todos acreditam honestamente que seu sistema é o melhor para o bem da humanidade. 

Outros personagens se tornam essenciais ao longo da série. Kircheis, o amigo de infância de Lohengramm, ajuda-o na escalada do poder; Oberstein, uma idealização de Maquiavel, frio e calculista, é o suporte firme do Império; Minci, o enteado de Wen-li, importante no último arco. Quase todos eles apresentam nomes teutônicos, talvez uma referência às investidas imperialistas da Alemanha no século XX.

A animação é típica dos anos 80, e ela foi mantida praticamente igual ao longo de quase 10 anos de publicação. Somente a paleta de cores foi realçada. O estilo é contido e moderado, sem os olhos grandes característicos das animações japonesas, combinando com os personagens europeizados. Depois da metade da série, há uma mudança gráfica inesperada: chacinas, intestinos expostos, cabeças decepadas, empalamentos e outros tipos de violência dão o tom da guerra.

O anime peca na excessiva narração do que está acontecendo na história, não abrindo espaço para o espectador resolver os quebra-cabeças por si próprio. Em todo momento, inclusive nos mais simples, quando bastasse deixar os diálogos transcorrerem normalmente, escuta-se o narrador explicando obviedades. A representação das estratégias de guerra nas telas das naves espaciais me incomodou, crítica válida para a novel, se for o caso. O desenho da posição das naves e sua movimentação me pareceu tão simplória que diminui a importância de todo o diálogo expositivo associado.

Diferentemente de Gundam Seed, onde se vê as naves e os Gundam’s se movimentando e atirando freneticamente, aqui se visualiza somente as frotas, quase estacionadas, atirando umas nas outras. Os tiros das naves são linhas de luzes que aparecem e somem repetidamente, sem o movimento através do espaço. As naves mais se parecem com tanques de guerra, pouco móveis e lentas, flutuando no espaço sideral. Diga-se de nota que as naves da Aliança apresentam uma arquitetura que não lembra em nada uma hipotética máquina desbravadora do espaço. Esses pontos são pequenos detalhes diante do que realmente importa em uma obra ficcional.

Durante LoGH, trilhas sonoras com grandes clássicos como Chopin, Mozart, Dvorak, Wagner, Mahler, Bach, Bruckner, e Brahms ambientam as intrigas, os ataques e suas consequentes retaliações. As canções de abertura são em inglês, interpretadas por Michiru Akiyoshi (1ª e 2ª temporadas), LISA e Hitomi Konno, todas cantoras japonesas. As canções de encerramento são interpretadas por Kei Ogura. Todas elas possuem um tom clássico, com orquestrações que acompanham seus vocais. Boas montagens são mostradas com os personagens durante elas, dando dicas de como terminará cada temporada.

Legend of Galactic Heroes é uma obra descomunal na história da animação japonesa. Enredo, personagens, trama, tudo é construído brilhantemente para a abordagem de temas complexos da humanidade. Como é possível que muitos não conhecem LoGH e fiquem atolados nesses animes ecchis lançados como mero produto descartável de uma temporada? Recomendo LoGH para quem aprecia temas militares e políticos executados em modo Star Wars.

2 comentários:

  1. Ótimo texto! Fico feliz por esse genial anime ainda ter certa visibilidade.

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    1. Obrigado pela visita. Torçamos para que o remake do ano que vem seja tão bom quanto o original. Abs.

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