Episódios: 23
Ano: 2012
Estúdio: Kyoto Animation
Gêneros: Mistério, Escolar, Cotidiano
Sinopse: Houtarou Oreki, um estudante do ensino médio obcecado por
conservar energia, termina com sua rotina quando se inscreve no Clube de Literatura
Clássica, a pedido de sua irmã - especialmente quando percebe a profundidade de
sua história. Com má vontade, Oreki é arrastado para uma investigação sobre o
mistério de 45 anos que rodeia a sala do clube.
Acompanhado por seus companheiros de clube, o “banco de dados” Satoshi
Fukube, a séria mas amável Mayaka Ibara, e a sempre curiosa Eru Chitanda, Oreki
deve cumprir os prazos e a falta de informações com desenvoltura e talento, a
fim de não só encontrar a verdade enterrada sob a poeira de fatos ocorridos anos
antes deles, mas também de outros pequenos casos paralelos.
Baseado na premiada novela Koten-bu, dirigida por Yasuhiro Takemoto de
Suzumiya Haruhi no Shoushitsu, Hyouka mostra que a vida cotidiana pode estar
cheia de pequenos mistérios, seja em histórias familiares, num filme estudantil,
ou mesmo nas flores murchas que compõem um conto de fantasmas.
Séries que têm o mistério
investigativo como tema principal geralmente desenvolvem enredos mirabolantes,
com reviravoltas quase impossíveis e vilões movidos a insanidades incomuns. É
uma característica do gênero, que busca, como toda ficção, oferecer uma fuga da
realidade para seus consumidores ávidos de aventuras e esforço mental na
montagem dos quebra-cabeças do mistério. Contudo, esquecemos que a mesma e
velha rotina na qual vivemos o dia-a-dia pode ser repleta de segredos e
descobertas que alimentariam uma mente racional bem treinada. Hyouka
exemplifica isso nos problemas aparentemente simples que podem se tornar quase
insolúveis, se não forem olhados pelo escopo correto.
O nome do anime trata-se do
grande mistério que ronda a série, que é resolvido antes de sua metade. Há
várias histórias que vêm antes e depois dela, em especial o arco do festival
cultural da escola, que para mim deveria ter sido o final da série. Hyouka
acompanha os seus quatro personagens principais se envolvendo como autênticos
detetives nos casos, com uma subtrama de caráter amoroso que toma conta dos
episódios finais. Há mistérios tanto de um episódio como de quatro.
Hyouka possui uma forte carga de
ambiente escolar. Quase todos os casos se relacionam em alguma medida com a
vivência na escola. Por esse motivo, podem ser vistos como o “fantástico dentro
do banal”. Mas o fantástico em Hyouka é a capacidade de um dos personagens em
criar inferências a partir de pistas que muitos achariam inúteis, ou mesmo não
perceberiam que são pistas. Como Edgar Allan Poe escreveu com propriedade em
“Os Crimes da Rua Morgue”, “o poder analítico não deveria ser confundido com
uma simples habilidade (...), pois o analista é engenhoso, mas o engenhoso, não
raro, é incapaz de análise”. Assim, o mais interessante em Hyouka é o caminho
mental percorrido para a resolução dos mistérios. Fora isso, seu enredo é comum
à maioria dos animes escolares.
Afirmei acima que o anime deveria
ter se encerrado com o fim do arco do festival cultural, no episódio 17. Seria
um bom momento para o término, já que sua maior parte girou em torno da antologia.
Os episódios posteriores ao festival possuem um anticlímax, como se fossem
apêndices da trama principal. Salvo uma atenção maior com a cronologia da light novel original, estariam melhor
inseridos se talvez fossem remanejados para o início do anime. Em especial, os
dois últimos episódios deixaram um gosto amargo que discrepa com o tom mais
alegre do resto da série.
Com a intenção de se ter um grupo
investigativo, a produção caracterizou seus personagens de maneira bem distinta
e funcional. Da mesma forma que um Dr Watson completa Sherlock Holmes e Arthur
Hastings a Hercule Poirot, Oreki não seria ninguém sem Chitanda, Fukube e
Ibara. Oreki é um gênio latente que deixa a preguiça dominar suas faculdades
cognitivas. Para contornar essa situação, existe Chitanda, uma garota com voz
de anjo (e nome também) super-ultra-hiper-mega curiosa que o empurra para todas
as menores dúvidas possíveis. E também para mudanças drásticas na sua rotina,
que deverá influir bastante em sua vida futura. Há uma evolução clara em Oreki,
que passa a cada vez mais sair de sua monotonia habitual. Por outro lado,
Chitanda é uma das personagens mais fofas e puras que eu já vi em animes. Ela apreende
um lado oculto em Oreki que a faz admirá-lo crescentemente com o tempo.
Do outro lado da mesa, há Fukube
e Ibara. Fukube é um garoto com ótima memória que sabe um pouco de tudo.
Inicialmente, aparenta não carregar sentimentos ou aspirações relacionadas a
uma improvável preponderância nas resoluções dos casos. Como ele próprio
afirma, “um banco de dados não é capaz de criar teorias”. Mas com o desenrolar
da história, é claramente o personagem mais complexo dos quatro, com uma
atitude autoimposta relacionada ao seu passado e que determinará seu
relacionamento com Ibara. Esta é o papel que destoa entre eles. Ibara não
apresenta um comportamento peculiar além de sua fraca rabugice com Oreki, que
gera algumas piadas viáveis para o anime.
Hyouka tem uma animação realizada
com esmero. A Kyoto Animation fez um trabalho detalhista nas expressões
faciais, nos gestos particulares de cada personagem e até nos planos de fundo,
com tonalidades vívidas e agradáveis aos olhos. A iluminação utilizada é uma
das melhores que já assisti em animes. O estúdio recorre a quadros que diferem
do estilo normal do anime para visualizar os argumentos expositivos com mais
eficiência. Eu diria que o resultado final é digno da qualidade exigida em
salas de cinema.
Em relação à parte sonora, é raro
eu prestar mais atenção ao trabalho dos dubladores do que às trilhas sonoras.
As quatro canções de Hyouka são comuns e não me impressionaram de alguma forma.
As aberturas de ChouCho com “Yasashisano
Riyuu” e “Mikansei Stride” de Saori Kodama são poppy’s com vocais femininos que
nada acrescentam ao também comum enredo do anime. Da mesma forma são os
encerramentos, “Madoromi no Yakusoku” e “Kimi ni Matsuwaru Mystery”, ambos de Satou
Satomi & Kayano, que me deixaram com gosto de algodão doce na boca. Por
outro lado, a dublagem é eficaz na caracterização, principalmente através das
personagens femininas. A técnica que a dubladora da Chitanda emprega é
magistral, pois não é possível que alguém nesse mundo tenha uma voz natural
mais fina e angelical. Já a dubladora de Ibara chama atenção pela entonação e
tiques nervosos da personagem.
Hyouka é ótimo anime de mistério escolar, que combina aspectos técnicos
de excelência com um enredo que, sendo trivial na ambientação, é convincente em
sua execução. Não espere assassinatos, espionagem internacional ou assuntos habituais
ao gênero mistério policial. Aqui é tudo relacionado à rotina juvenil,
inofensiva e aventureira. Bem superior a trabalhos próximos como Gosick e
Heaven's Memo Pad, Hyouka é um anime que merecia mais temporadas pelas boas
histórias de “detetive do comum” que entregou, além, é claro, das nuances
lógico-argumentativas de Oreki, que são a cereja do bolo.
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